Agora Cronico Eu,  O Comboio de Karenina

Um obsessivo-compulsivo em tempo de pandemia

Num mundo em que as palavras de ordem são: LAVEM AS MÃOS O MAIOR NÚMERO DE VEZES POSSÍVEL e FIQUEM EM CASA, ISOLEM-SE, há quem não coloque em causa as consequências que isto pode ter para um Obsessivo-Compulsivo que, na maioria dos casos, recorre ao isolamento como fuga ao confronto, crucial à sua terapia, e, para os que sofrem com rituais a nível de contágio, que tiveram de aprender a evitar as lavagens compulsivas das mãos.

Além de que, para estas pessoas, o risco de contágio possa ser, significatimente menor, existe um enorme risco de comprometer meses (ou anos!!) de terapia, não falando que o estado de emergência compromete também as consultas presenciais e, a crise económica que se adivinha, pode colocar em causa a disponibilidade financeira de muitos para continuar a terapia, mesmo em modo virtual!

Estou, claramente, inserida em todas estas categoria, além de que, pelas minhas condições de saúde física, a nível respiratório, me colocarem dentro de outro grupo de risco! Então, neste últimos dias, tenho pensado muito como sobreviver ao presente e ao futuro dentro de todas estas premissas! Não, ainda não encontrei resposta mas, obsessiva como sou, não páro de as procurar e de estabelecer teorias, mais ou menos idílicas, sobre o que preciso de alterar nos meus comportamentos de forma a não comprometer a minha saúde física e mental. E, a minha conclusão é: acho muito mais fácil defender a minha condição física do que a mental, sem sombra de dúvidas!

A minha quarentena, iniciou.se há meses! Nada do que se está a passar agora alterou o meu modo de viver. Desde há uns meses que a minha situação financeira, me obrigou a pausar a terapia (tanto com a minha psicóloga, como com o meu psiquiatra!), o meu estado de saúde fragilizado obriga-me a defender-me das condições climatéricas deste Inverno, retendo-me em casa, tendo em conta que, desde que me mudei para Alcobaça, tenho tido muito mais, e maiores, ataques de sinusite do que os que tinha quando vivia no Alentejo. A depressão que enfrentei nos meses de Outubro e Novembro, votaram-me ao isolamento, que, apesar de a ter ultrapassado com a mudança para a minha nova casa, essa alegria, me fez isolar-me ainda mais.

Neste sentido, como evitar uma crise emocional perante as condições que me apresentam os riscos de saúde pública? Como evitar uma recaída em sintomas de contaminação quando ainda “o mês passado” me diziam para parar de lavar as mãos compulsivamente? Consciência redobrada, atenção redobrada! É agora o momento de colocar à prova toda a terapia que fiz!!!!, Como?

1- ter consciência quando lavo as mãos, para além dos momentos “normais”. Questionar se o estou a fazer porque, de alguma forma, me posso ter comprometido e ter tocado objectos possivelmente contaminados, ou se o estou a fazer como coacção da minha ansiedade?

2 – ter a certeza e a compreensão de que objectos ou superfícies podem ser mais susceptíveis à contaminação. Se ninguém pegou no meu comando de televisão e se eu tenho as mãos limpas, não preciso de o desinfectar.

3 – ter mais atenção em não tocar com as mãos na cara, para evitar a ansiedade de lavar as mãos!

4 – ocupar-me, ocupar-me, ocupar-me!!!!! E aqui entra, consequentemente, a questão do isolamento.

5 – Isolamento físico não significa isolamento social. Estamos todos no mesmo barco e as redes sociais são, cada vez mais necessárias e cruciais.

6 – Manter um diálogo com elementos do meu grupo terapêutico, mantendo um equilíbrio entre conversas produtivas acerca do estado em que nos encontramos e entre as conversas quotidianas que existiam antes deste estado de emergência. Trocar experiências e conselhos sobre como reagir a tudo isto de forma segura.

7 – Ler, ler, ler… mas seleccionar, cada vez mais o tipo de leitura que faço. Eu já sou, por natureza, muito picuinhas com o que leio, mas aguçar ainda mais esse sentido, de forma a aproveitar este tempo (que já tinha) num mundo em estado de excepção (que é novo para a minha geração e a anterior a mim), para desenvolver, cada vez mais, o meu espírito crítico e, se possível, o dos que me rodeiam!

8 – Alternar períodos de leitura com outras actividades, como levar os cães à rua, ver televisão, conversar com outros, para não correr o risco regredir na minha relação obsessiva com os livros

9 – afastar-me das redes sociais por períodos consideráveis, de modo a continuar, mesmo que agora não nos seja possível, a preferir o contacto presencial, ao invés do virtual.

10 – ACIMA DE TUDO: Ter capacidade de fazer um pensamento com base na terapia para ser capaz de filtrar o que são comportamentos/pensamentos de ansiedade e alarmistas e onde encontro comportamentos lógicos e eficientes.

Porque, além de tudo isto, um dos grandes perigos para um obsessivo-compulsivo são as fases de evitamento, nas quais, e com receio de uma regressão a nível de comportamentos, se começam a desenvolver rituais opostos aos primeiros, por exemplo a não lavagem das mãos, mesmo quando absolutamente necessário.

Se há obsessivo-compulsivos que se encontram em terapia há muitos anos, também os há que só foram diagnosticados recentemente e que, por isso mesmo, não possuem ainda ferramentas muito desenvolvidas ou medicação completamente ajustada (eu tomo medicação há dois anos e ainda estou em ajustes) e, pior ainda, casos que nem sequer estão diagnosticados, que nos tornam, a uma grande maioria, bastante vulneráveis ao estado de alarme em que somos colocados!

É por todas estas razões, e tantas outras, que é necessário perceber que este isolamento não pode ser um fechar-se sobre si próprio e sobre as suas convicções, mas sim um espírito de abertura, união, altruísmo, compaixão e consciência, acima de tudo!

O mundo, como o conhecemos, está em mudança, e pode ser uma mudança radical, e para que ela seja produtiva e eficiente, precisamos, cada vez mais, da humanidade que existe em cada um de nós!

É provável que isto esteja tudo errado, é provável que daqui a uns dias mude de opinião, é provável que não consiga manter a mente tão limpa nos próximos tempos. Mas é o reflexo do que esta pandemia nos traz, uma necessidade emergente de adaptação e re-adaptção a um (novo) mundo em constante mutação!

#stayhealthy #staysafe

© Photo by Alex Iby on Unsplash

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