
“Circe” e “O Canto de Aquiles” de Madeline Miller
Madeline Miller lida com o que é clássico desde os seus estudos universitários, tendo sido professora de Latim, Grego e até de Shakespeare. Para quem leu “O Canto de Aquiles” ou “Circe” este caminho profissional é muito fácil de prever, tendo em conta que ambos recontam histórias da mitologia grega.
“O Canto de Aquiles”, escrito em 2012 conta-nos a história de Aquiles, filho da Deusa Tétis e do mortal Peleu, o mais forte dos mais fortes, destinado a grandes feitos bélicos. Acompanhamos a sua juventude na ilha onde o seu pai é rei e recebe filhos expatriados pelos seus pais, bem como o seu treino com o centauro Quíron e, finalmente, a sua participação na guerra de Tróia, ao lado de personagens como Ulisses.
“Circe”, escrito em 2018, traça a vida de uma ninfa, “a menor das deusas menores”, filha de Hélio e Perseide, sobrinha de Prometeu, amante de Ulisses, feiticeira dos animais e a que ajuda a dar à luz o Minotauro. Expatriada por Zeus, após ter descoberto os seus poderes, Circe constrói a sua vida na ilha de Ea, onde, tal como o “lugar-comum” indica, o que a magoa torna-a mais forte.
Não julgo que valha a pena entrar em grandes divagações à volta do significado destes livros, no final de contas, em ambos, o amor acaba por vencer, sempre depois de grandes lutas, físicas e emocionais. Por isso, a mensagem dos livros tirará cada um a sua e a mim não me passou mais do que momentos de bonita emoção envolvida em magia, mais do que entretenimento, experiencei tanta emoção, envolvi-me tanto com as histórias e criei muita empatia pelas personagens – Aquiles fez-me chorar bastante!
Madeline Miller tem uma escrita simples mas nada descuidada, muito pelo contrário, as palavras são bem escolhidas e as frases bem alinhadas, resultando num todo muito harmonioso. Essa harmonia, em conjunto com a economia de descrições e detalhe (a autora não deambula em histórias nem se alonga em detalhes que não sejam significativos para a história) transportam-nos para o ambiente divino retratado em ambas as histórias. Fiquei muito maravilhada com as descrições de cenários, não só exteriores, como interiores, consegui visualizar-me naqueles mundos, com aquelas vestes e aqueles rituais… Esta harmonia é maior em “Circe”, o que não é de admirar, tendo em conta os 6 anos que separam as obras (um exemplo disso é a descrição mais exaustiva da guerra de Tróia, em “O Canto de Aquiles”, “receita” que a autora não repete mais tarde). Além disso, este primeiro livro foi escrito ainda durante os seus anos de universidade, por isso é normal que, em comparação, se sinta no livro um compromisso maior com os factos. No entanto, isto é um mero pormenor, a diferença da riqueza e da densidade emocional da escrita é relativamente ligeira de um para o outro. E, quem ler apenas o primeiro, vai conseguir sentir a mesma empatia e a mesma envolvência nestes ambientes mágicos e divinos que Miller consegue proporcionar – tanto que, “O Canto de Aquiles” é o meu favorito dos dois, e li “Circe” em primeiro lugar.
Resumindo, são livros bastante especiais para quem gosta de ambientes mágicos, de histórias com personagens fortes que são postas à prova constantemente, que não podem baixar os braços um minuto que seja, que precisam de lutar até contra a sua própria família, mas que o fazem até às últimas consequências se for isso o necessário para prosseguir a sua felicidade. Quanto à parte mitológica, as figuras (porque a mitologia não é feita apenas de Deuses) são apresentados como personagens normais de uma história e Circe traz um apêndice no qual as apresenta.
Curiosidades: “O Canto de Aquiles” demorou 10 anos a ser escrito e “Circe” será adaptado para série pela HBO Max.
