“Einstein on the Beach” Philip Glass, Robert Wilson, Lucinda Childs e Christopher Knowles
Há uns dias o Paulo, o bookstagrammer PJV – diário de um leitor, estava a ouvir Philip Glass e isso transportou-me imediatamente para “Einstein on the Beach”, uma ópera que Glass compôs para ser encenada por Robert Wilson.
Glass é o autor da maravilhosa banda sonora do filme “As Horas”. Pese embora a sua música nos embale numa doce melodia, ela tem sempre um toque que nos faz torcer o corpo de estranheza. “Einstein on the Beach” eleva essa estranheza aos píncaros do electrizante. Não é uma ópera fácil de se ouvir principalmente para quem tem em si noções muito pré-estabelecidas do conceito standard de “ópera”.
Não escolhi o adjectivo electrizante à toa, não! É mesmo isso que se sente, descargas eléctricas constantes, sons metálicos, repetidos em loops que parecem intermináveis e nos fazem sentir num limiar de loucura. Atém de Glass ser um fã da repetição, houve outros pormenores que ajudaram a vincar esta marca no libreto. Na altura do início dos ensaios o compositor entregou a Wilson apenas a música e, para marcar ritmos e melodias, o encenador pediu ao corpo de bailarinos que repetisse contagens de números e a escala musical, que acabaram por permanecer no guião. O poeta e pintor americano Christopher Knowles, cujo trabalho repetitivo e absurdo reflecte a sua personalidade autista, foi também uma chave para assegurar a coerência do guião – um dos poemas que escreveu foi repetido 43 vezes*.
Toda esta perfeição foi possível porque tanto Glass como Wilson, a quem se junta Lucinda Childs que coreografou a peça, trabalham de forma recta e matemática, todos os pormenores são importantes, 2+2 são sempre 4, mesmo que tenhamos que lá chegar somando 0,5+0,5+0,5+0,5+0,5+0,5+0,5+0,5.
A ópera estreou em 1976 no Festival de Avignon com uma duração de 5 horas sem intervalo mas permitindo que o público saísse e entrasse à sua vontade.
Quando confrontado com o facto de “Einstein on the Beach” ter revolucionado o mundo da ópera, Glass afirma que isso não é verdade pois, desde há 46 anos, nunca mais nada do género foi feito.
“There was never another Einstein. No one did The Son of Einstein or Waiting for Einstein. It never was imitated.”
Com tudo isto posso dizer que é uma obra estrondosa, magistralmente dirigida mas que pode não ser de fácil digestão e que ajuda estar já imerso no mundo artístico de Glass para que a estranheza do frenesi electrizante do compositor nos estimule ao invés de nos repudiar.
*poema de Christopher Knowles repetido 43 vezes:
I was in this prematurely air-conditioned super market
and there were all these aisles
and there were all these bathing caps that you could buy
which had these kind of Fourth of July plumes on them
they were blue and red and yellow
I wasn’t tempted to buy one
but I was reminded of the fact that I had been avoiding the beach.
Se tiverem curiosidade podem aceder ao libreto aqui e ver alguns excertos através da playlist abaixo: